O Deus das Pequenas Coisas - Arundhati Roy

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Esta é a história entrelaçada de três gerações de uma família indiana. Estha e Rahel, gémeos biovulares, crianças irrequietas e de imaginação fértil, são o centro de tudo. Com uma cumplicidade e uma amizade infinitas vão marcando a vida de todos à sua volta e nem todos os vêm com bons olhos. Crescendo sem pai, tragédia praticamente inaceitável mesmo pela família, deambulam, brincam, criam os seus cenários, as suas brincadeiras que mais ninguém entende, com uma linguagem própria de quem se conhece um ao outro como a palma da mão.

A sua mãe, Ammu, passa ao lado da vida até encontrar um amor proibido que a levará à desgraça. O seu tio, Chacko, passa ao lado da vida até reencontrar a filha que não viu crescer e a ex-mulher que não o quer. A sua avó, Mammachi, passa ao lado da vida a carregar as cicatrizes da mão pesada do marido e a vergonha da família. Baby Kochamma, tia-avó, passa ao lado da sua vida, tomando a dos outros como a sua e dificultando tudo a todos por ter tido um amargo passado. E a vida vai acontecendo e muitas coisas precisam ser ditas, deitadas para fora, partilhadas, mas todos falam apenas das pequenas coisas. Estas são mais fáceis de deitar cá para fora. As outras ficam entaladas na garganta. E quem precisa das coisas grandes, quando sentir os pés molhados pelo rio lamacento, observar o voo das borboletas, dar nomes e cheiros às cores é tão mais importante?

A tragédia vai marcar esta família para sempre e nada, nunca mais, vai ser o mesmo. Estha e Rahel, 23 anos depois de uma vida separados, encontram-se. Irmão e irmã que se tornaram desconhecidos mas ligados por uma força que mais ninguém compreende e memórias só deles. A culpa, o peso nos ombros, as costas curvadas pela maldade não importam quando se têm um ao outro, por fim.

Um livro daqueles que é muito mais do que um livro. É um retrato social de uma Índia formada por uma sociedade de castas, um sistema injusto num clima político fervoroso. É uma viagem por estradas, rios, cheiros, cores que desconhecíamos e que sentimos como nossos. É uma ida ao pormenor imensamente bem conseguida. É um transporte autêntico para outro país, outra família, outras relações que não julgávamos possíveis. É estar sempre a voltar atrás na leitura, porque há tanta coisa que merece ser relida e ficar cá dentro mais um pouco.

Este foi o único livro de não-ficção escrito pela autora. Arundhati Roy ganhou o Booker Prize no ano de lançamento do livro em 1997. Não é fácil de ler. Parece que a autora tinha em si o mundo para contar e fê-lo, com toques auto-biográficos. E isso merece uma leitura cuidada e sentida.

O Deus das Pequenas Coisas
De: Arundhati Roy
Ano: 1997
Editora: BIS
Páginas: 368

A nossa pontuação: ★★★★☆
Disponível no site Wook.

2 comentários:

  1. Aqui está um livro sobre o qual li imenso, mas que ainda não tive oportunidade de comprar e ao ler o seu texto recordei-me do filme da Mira Nair, "Casamento Debaixo de Chuva", em que era possível ver o funcionamento das castas na sociedade indiana.

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    1. É daqueles livros que não posso deixar de aconselhar, tenho a certeza de que vai adorar! A questão das castas é impressionante e determinante para toda a acção. Depois de ler diga o que achou :)

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